sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Inspiração Criadora X Inspiração Organizadora














Será a inspiração organizadora desta nova era sem arte uma nova forma de se manifestá-la, ou o que se faz é algo inteiramente inédito e incomparável por essência? A era da edição e da colagem prevê somente o encontro de realidades distantes em um plano alheio a ambas, ou recria uma dimensão própria de seu tempo? Questões como esta colocaram a vida da Arte em cheque após a sinergia dos anos 70.

A percepção básica do espírito contemporâneo se formou sobre o princípio de um museu onde toda arte tem seu próprio lugar, onde não há à priori nenhum critério sobre o qual a Arte deva ser vislumbrada, onde não há um relato sobre um olhar contextualizante; hoje “os artistas não consideram que os museus estão cheios de arte morta, mas sim de opções artísticas vivas”.

Tomemos Monet e o impressionismo como base para pensar na eternamente hipotética [ou hiperpatética?] situação atual: era então a emancipação do movimento modernista, e valorizava-se evidenciar o caráter da representação na própria representação, ou seja, no caso do pintor citado, ilustrar a bidimencionalidade, que no caso ele optou pelo uso do alto-relevo para aludir à sua limitação, e o distorcer/desfocar como “erro acertante” ou caracterização própria, pincelada de subjetividade. É então que nasce a necessidade de um olhar subjetivo, que passa a ser exigido pela própria obra. Não mais um olhar de inspeção sobre a representação, mas sim um olhar investigativo, questionante, demandando uma participação mais ativa no olhar do admirador. Com o fim da arte após os 70, o nível de consciência ultrapassa o simplismo da auto-evidenciação através dos elementos próprios, esgota-se esta natureza como identidade, e assim cria-se um vácuo semântico na tentativa de definir-se, perdendo-se em um demasiado pluralismo de intenções e ações, sem permitir-se objetivamente encerrar-se numa única dimensão. Ora, como irá a humanidade do futuro citar a atual produção artística se ela é quase toda composta por citações?

A arte coeva nos convida a contemplação reflexiva, mas não com a finalidade de produzir novamente Arte tal qual a concebíamos, mas sim numa tentativa de conhecer, talvez cientificamente, o que a própria arte de fato é, está sendo, ou simplesmente foi. A Arte Moderna, ou o modernismo, implica no registro de uma época, assim como foi o Romantismo, enquanto que a arte contemporânea só consegue ganhar a conotação original da palavra, muito menos que uma conotação temporal ou estilística, como acabou agregando-se o Moderno àquele período de tempo em que frutificava em nossas sociedades a arte dita Moderna. O conflito nasce quando a arte 'moderna', ou melhor, a arte contemporânea, ou melhor ainda, a arte coeva, deixa de ser Moderna (com M maiúsculo). Para que não se caísse novamente em um buraco-negro semântico, fazendo uma palavra mudar sua função e precisar-se adotar uma nova palavra, alguns teóricos arriscaram a proclamar uma nova era para a Arte, que seria esta a “pós-modernidade”.

A arte moderna, trazendo a possibilidade de arte para qualquer objeto real (e não mais somente os pré-estabelecidos quadros, ou esculturas, enfim, veículos pré-definidos e já consolidados) fez nascer uma Filosofia da Arte, como emancipação de uma necessidade conceitual de um fundo filosófico implícito em cada concepção de arte - o surgimento da idéia de arte conceitual. Nada mais poderá ser considerado devidamente como sendo Arte sem que se dê à esta uma base filosófica que a explique e contextualize? Não sei, me responda você...

Vivemos num universo policultural, e cada cultura parece existir em seu próprio tempo, espaço-tempo, espaço que que indefine-se com a globalização das tecnologias, e que, portanto, indefine-se por tabela seu próprio tempo, sua frequência de efervescência social, ou seja, vivemos num tempo de inúmeros tempos, onde não adianta dizer que se está hoje, sem se dizer como é este hoje, que já não se conhece ou se afirma com uma unanimidade conceitual estabelecível. É o fim da sociedade disciplinar, onde se espera que cada individuo esteja motivado à seguir um parâmetro de normalidade pré-estabelecida e obedecer à infinitas regras diante do olhar julgador de toda a sociedade “normal”, vivemos numa sociedade agora do controle, onde qualquer um é suspeito potencial no que se refere ao escapar das regras, qualquer um pode ser qualquer coisa! A nova arte, da era da Ilha de Edição e do Photoshop, Corel Draw, Kpaint, Adobe Premiére, Avid, etc. precisa situar-se numa dimensão temporal própria, dimensão tal que só ela mesma poderá definir suas respectivas características.

“O que é isso que eu tenho que nenhuma outra classe de arte possuí?” - pergunta-se, ainda, a Arte Moderna. A auto-consciência da arte coeva já não pergunta “quem sou agora”, mas apenas “quem sou” num sentido mais amplo, tentando assim responder científica ou abstratamente o enigma do que define a arte por si mesma. E o papel do artista contemporâneo? Investigar a natureza da própria arte e só? Hoje tudo pode se tornar uma obra de arte, inclusive uma personalidade, ou até mesmo simples pessoa.

O que define a Arte e sempre a definiu? Talvez a própria incapacidade de definí-la seja a própria capacidade única que a define, fechando-a ou abrindo-a à um paradoxo tal qual o da existência humana.

E se me perguntarem se sou artista, direi que não estou artista, que artista é aquele fenômeno existencial vivenciado por quem faz uma leitura artística diante de alguma presença criativa e só.


Uirá Felipe Grano Gaspar


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